quinta-feira, 14 de março de 2013

Trabalhadores da Cotrijui não pensam em greve, mas estão em “estado de alerta”



 A assembleia ordinária realizada pelo Sindicato dos Empregados no Comércio de Ijuí na noite desta quarta-feira (13), teve como pauta principal a situação envolvendo os trabalhadores da Cotrijui. A principal questão é o atraso de salários em alguns setores da empresa, desde janeiro. Outra preocupação dos trabalhadores é a situação financeira da empresa.

A assembleia, completamente lotada, teve a coordenação da presidenta do Sindicato Rosane Simon e a participação do presidente da Fecosul e da CTB/RS, Guiomar Vidor e dos presidentes dos Sindicatos de Três Passos, Moacir Zagonel e Santiago, Carlos Alberto Ataídes Florian.

Rosane Simon abriu o debate explicando aos trabalhadores que a direção do Sindicato havia convidado a direção da Cotrijui para participar da assembleia. “Esta é uma assembleia de trabalhadores, mas diante da situação, convidamos a direção da empresa para que possamos abrir um diálogo franco e sincero, buscando uma solução que contemple a todos”, explicou a presidenta. Rosane fez um histórico das reuniões que manteve com os diretores da cooperativa e das ações que o Sindicato havia realizado, para regularizar o pagamento dos salários. “Oficiamos a empresa para que nos desse uma resposta quanto ao pagamento dos salários e também marcamos audiência no Ministério Público do Trabalho, que acontecerá na próxima terça-feira (19), para tratar desta questão. Não queremos forçar nenhuma situação, mas sem o pagamento dos salários não há como manter o trabalho. Patrão também merece justa causa quando não cumpre com as suas obrigações”.

O presidente da Federação, Guiomar Vidor, relatou aos trabalhadores que acompanha a situação desde o começo. “Esta não é somente uma questão que envolve nossos direitos como trabalhadores, mas é também uma questão social que tem implicações em todo o estado”. Guiomar relatou que mantém contato com a Fetag (Federação dos Trabalhadores na Agricultura) e a Ocergs (entidade que representa as cooperativas do estado) para viabilizar todas as possibilidades de que a empresa supere o momento de dificuldades, mas garantiu que em primeiro lugar está o interesse dos trabalhadores da empresa.


Vanderlei Fragoso
Presidente quer salvar o “Titanic”
“Não pesa a responsabilidade de estar a frente da empresa, apesar de todos os problemas, mas a responsabilidade de estar diante de vocês é enorme”, disse aos trabalhadores o presidente da cooperativa, Vanderlei Fragoso, acompanhado por diretores.

Vanderlei expôs que a diretoria comparecia à assembleia de “coração aberto”. “Reconhecemos a importância do pagamento dos salários e a legitimidade da mobilização de vocês. Estamos aqui porque nos propomos a trabalhar com seriedade, transparência, honestidade e comprometidos em saldar todos os compromissos. Mas é necessário expor para vocês a realidade nua e crua: é um grande Titanic que temos pela frente”.


Contabilidade está aberta
Munidos de documentos, os diretores relataram a situação financeira da cooperativa e colocaram estes documentos a disposição da sociedade. Segundo o diretor administrativo Lothar Hein Warner, um fato histórico, pois nunca a empresa abriu estes números à uma assembléia sindical.

Considerando os meses de janeiro e fevereiro, a cooperativa faturou próximo a R$ 93,5 milhões, um resultado abaixo do histórico. O saldo negativo no período é de 8 milhões e destes, 6 milhões são relativos a custos financeiros e juros. “São muitas as dívidas e com os compromissos em atraso, aumentam ainda mais estes custos”, disse Lothar.

Gilmar Fragoso
Gilmar Fragoso, diretor superintendente, expôs que a diretoria está fazendo uma “grande ginástica financeira” para saldar os salários porque entende que é a sobrevivência do trabalhador, mas que hoje as receitas são bem menores que as despesas. “Hoje realizamos o pagamento de quem recebe até R$ 1500,00 líquido. Não fizemos isso em função da mobilização de vocês, mas do compromisso que temos com vocês e em função da disponibilidade de caixa”.

Gilmar disse ainda que faltam R$ 485 mil referentes aos salários de janeiro e um saldo de fevereiro. Segundo ele, a empresa programou o pagamento destes salários para 15 de fevereiro passado, mas em função do bloqueio de 3 milhões de reais referentes ao leite, isto não foi possível. “Não é para justificar, mas para dar transparência ao que está acontecendo”.

O presidente Vanderlei Fragoso foi mais fundo na questão financeira. Relatou que em junho do ano passado, quando foi anunciada a crise, era o momento da ação não só da diretoria mas também de todos as forças da sociedade. “Quando tomamos posse da situação financeira caótica da Cotrijui, percebemos que ela caminhava a passos largos para ser vendida”. Vanderlei disse que há documentos que comprovam este movimento que teria iniciado em março de 2011 e que empresas de capital internacional tem sondado a compra do setor de grãos, fundamental para a cooperativa.

Ele relatou ainda que “os que estão de olho” no grande patrimônio da cooperativa injetaram na empresa 70 milhões em dinheiro (pela venda da safra) balizados em “contratos leoninos” nos quais estas empresas puderam estabeleceram as regras e os preços para levar os produtos. Além disso, expôs que uma dívida de 7 milhões contraída com fornecedores de insumos está em aberto. Segundo ele, estes insumos foram vendidos aos associados, que pagaram a vista, mas o fornecedor não recebeu o seu pagamento. “Fomos verificar o saldo à receber dos associados nesta transação e há somente 160 mil em aberto, destes 7 milhões”. O mesmo caso se repete com as contas de fornecimento de adubos de 2011 e 2012. A direção enfrenta também problemas com corte de energia em algumas unidades. “Tudo isso nos angustia muito porque estes credores, que fizeram “um negócio da China”, indiretamente, relatam que estão monitorando os armazéns e a produção para um possível arresto”, disse o presidente.

Ao relatar a reunião que teve na mesma tarde com autoridades, expressou esta angústia. “Estivemos reunidos nesta tarde com o prefeito Ballin, com o Rui Polidoro (diretor da Fecoagro) e com representantes da Farsul, da Ocergs e da Fetag. Se eles estavam de cabelos brancos, estão com os cabelos mais brancos ainda, porque esta é a realidade da cooperativa”.

Segundo ele, a direção entende que estes problemas são de sua responsabilidade. Garantiu que esta direção não medirá esforços para que a Cotrijui retome a sua caminhada histórica e supere esta crise, mas que para isso será preciso a ajuda de todos, dos trabalhadores, dos associados e dos demais setores da sociedade, e fez um apelo. “Estamos diante de uma situação política e de interesse social e tudo o que eu peço a vocês, se é que eu tenho o direito de fazer este pedido, é para que não haja nenhuma paralisação, que diante da situação é legítima. Temos que tocar este negócio, porque sem vocês a máquina para, e se ela parar, eu digo isso para vocês de forma franca, não haverá dinheiro para o pagamento de salários”, desabafou.

Vanderlei Fragoso e Rosane Simon
O presidente solicitou ainda que os trabalhadores sejam “soldados” da causa, ajudando na relação com os associados e produtores para o recolhimento e entrega de grãos. “O negócio do futuro é produzir alimentos e isto é o que a Cotrijui faz, mas precisamos fazer com responsabilidade”.


Horizonte a curto prazo é a entrega da safra
Rosane Simon fez um apelo, em nome dos trabalhadores, para que a direção estabelecesse, objetivamente, um prazo para o pagamento dos salários. “Estamos diante de uma turma de trabalhadores que é aguerrida e que veste a camisa pela empresa, nós sabemos muito bem disso, mas que também depende de um planejamento de seus compromissos”.

Vanderlei expôs que a cooperativa não tem mais acesso a créditos bancários e que alguns projetos estão em desenvolvimento para conquistar recursos dos governo Federal e Estadual. “Temos que exigir que quem nos deve, nos pague e ai poderemos pagar os salários”. O presidente frisou ainda que a curto prazo, o único horizonte de receitas para a empresa é a safra.

“Sinto muito mas não posso dar um prazo e prometer os salários para uma data. Mas garanto para vocês todo o nosso empenho, esforço e suor no sentido de fazer todo o possível para isso. Mas o negócio tem que girar”.

A direção se desculpou por não haver se reunido ainda com os trabalhadores dos diversos setores da empresa. Segundo eles, a diretoria tem se dividido em várias frentes, num esforço de achar soluções e encontrar o prumo.

“A Cotrijui é grande e tem que passar por uma reconstrução. Sei que vocês não queriam ouvir este balanço, mas esta é a realidade e os documentos estão disponíveis para quem quiser periciar. Estamos no mesmo barco e com a ajuda de todos vamos conseguir uma solução”, finalizou o presidente.


Não há clima de greve, mas trabalhadores querem tratamento igual entre os setores
Com aplausos, os trabalhadores agradeceram a presença da direção da Cotrijui e deram encaminhamento à assembleia. Houve consenso de que não é momento para uma paralisação e há consciência da necessidade de ajudar a empresa. “Queremos somente que todos os setores sejam pagos por igual. Há setores que estão recebendo em dia. Se temos que trabalhar por igual, queremos receber por igual”, disse um trabalhador. “Não nos omitimos em trabalhar mas temos que ter o mínimo para a luz e a água. Assim, que todos recebam pouco, mas recebam alguma coisa”, disse outra trabalhadora.

O Sindicato irá encaminhar esta demanda ao Ministério Público do Trabalho na reunião da próxima terça e segundo o advogado da entidade, Luiz Carlos Vasconcellos, um termo de ajuste de conduta pode ser firmado para obrigar a empresa e realizar o pagamento por igual.

A presidenta do Sindicato, Rosane Simon, explicou ainda que a assembleia decidiu por dar uma prazo até o final da próxima semana, aguardando o resultado da audiência entre o Sindicato e a empresa, no MPT e também a reunião da direção da empresa com o governador Tarso Genro, também na terça-feira, 19. “Entramos em estado de alerta até o final da outra semana. Vamos neste período concentrar nosso esforços para que seja dada no mínimo, uma solução política para esta questão com a ajuda dos governos municipal, estadual e federal. O Sindicato, a Fecosul e a CTB estarão junto neste esforço para reerguer a empresa, preservando os empregos e o direito dos trabalhadores”.

Guiomar Vidor
Para Guiomar Vidor, ficou claro que a situação não e boa e que uma greve não ajudaria em nada neste momento, tanto para os trabalhadores quanto para a empresa. “Quero colocar para a Fetag e para a Ocergs a proposta de, junto com os trabalhadores, realizarmos uma grande manifestação, uma atividade pública que chame a atenção das autoridades e da sociedade para esta situação, em busca de outras possibilidades de solução”. Como membro do conselho de desenvolvimento do estado,  o "Conselhão", Guiomar estará presente na reunião com o governador na próxima semana e promete mobilizar outros setores da sociedade e do governo.

Para finalizar, Rosane Simon solicitou aos trabalhadores que estejam atentos e vigilantes, fiscalizando e denunciando possíveis abusos aos direitos da categoria.

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